16 de dez. de 2008
Poeticos Dias de Sol
E a historia comeca e termina do mesmo jeito: no susto, na garganta apertada, nas maos suando frio.
O primeiro evento que relato com as caracteristicas acima citadas eh a noite de ontem. Ha dias, venho querendo ligar o meu sonzinho com uma lista de musicas no meu ipod, deixar baixinho, para adormecer e acordar ouvindo. Eu fiz uma selecao de musicas (jazz, musica caribenha, mpb, opera, Enya, blues...) para tocarem pelas horas em que eu estiver dormindo. E, por algum motivo que eu nunca vou entender, eu consegui colocar uma musica do Guns’n Roses no meio dessa selecao. Nao me levem a mal, eu gosto do Guns’n Roses, mas ter acordado as 2.34 da manha com o grito do Axl Rose (Welcome to the Jungleeeeeeeeeeeeeeeee), nao foi exatamente o que eu tinha planejado quando selecionei a lista de musicas para dormir.
E dai eu acordei, nao da forma que as pessoas acordam nos comerciais de margarina – afinal, tons muito agudos nao costumam me ajudar a relaxar!. Acordei e, em vez de desligar o som ou passar para a musica seguinte, eu sentei na cama e pacientemente ouvi o Axl cantar (ele foi muito bem pago para isso!). Quando ele terminou, e ia entrar o Srta Norah Jones, eu simplesmente voltei e repeti a musica dele. Por que?, a resposta eh simples, e eh a mesma que responde a maioria das grandes questoes de minha vida: “Sei la!!!”. Repeti a musica e fiquei la, meditando, resolvendo as grandes questoes da minha vida.
Comecei a pensar em quantas criancas naquele momento nao tinham onde dormir, nao tinham a oportunidade de ouvir o Axl Rose cantar as 2.34 da manha, morriam de fome, desinteria ou esquecimento; enquanto eu estava ali, ouvindo a musica pela segunda ou terceira vez. Pensei tambem em todos os ingredientes que ainda tenho que comprar para assar a droga do peru de Natal. Mas uma vez, peco: nao me levem a mal... eu ADORO assar o peru de Natal, eh um ritual que me da muita satisfacao, primeiro porque gosto mesmo de cozinhar (apesar de muitas vezes obter resultados duvidosos!), e segundo porque me lembra a minha maezinha, e a gente assando o peru de Natal juntas, eh uma forma estranha de me sentir perto dela. O que me irrita profundamente sobre o peru de Natal (bem mais do que acordar com os berros do roqueiro) eh o processo que antecede assar o peru: comprar o peru, comprar todos os ingredientes para temperar o peru, deixar o peru descongelando durante horas, marinar o peru periodicamente por 8 horas, tratar o peru com carinho e rezar para acertar na receita...
Depois veio a culpa - e nao tem erro: nada como uma boa dose de culpa pra dar aquele no na garganta!-. Como eh que pode, enquanto tantas criancas morrem de fome nesse exato momento, eu estar aqui tao preocupada se jah comprei canela e gergelim para (de novo!) a droga do peru de Natal?
O que seria de mim sem a minha culpa catolica?, nao sei!! No dia (hipoteticamente) em que a Igreja banir a culpa, e nos libertar de todo e qualquer sentimento de debito, acho q serah o fim da minha vida – assim como tambem o seria se o casamento do Brad Pitt e da Angelina Jolie acabasse ou se alguem publicasse a formula original da Coca-Cola!
A minha culpa catolica nao me impede de fazer nada, ela me leva a ponderar se devo ou nao, a considerar mais de uma vez, tentar ver as circunstancias sob outras oticas, e refletir, refletir, refletir... porque seja la qual for a decisao que eu tomar, sempre, havera uma decisao mais apropriada que poderia ter sido tomada – ou uma forma mais conveniente de se assar o peru. A minha cruz eh formada pelas frustracoes, aspiracoes, decepcoes (verticais), e pelo que eventualmente foi alcancado e fez alguma diferenca em alguma estagio para alguem (horizontais). Eh uma cruz muito alta, mas nao tao dificil de se carregar!
Um outro momento em que me senti com as maos suando, com no na garganta foi ha duas ou tres semanas, quando eu estava em uma livraria, escolhendo algo para comprar. Diante daquela infinidade de prateleira e de opcoes, eu me dei conta de quantas obras existem, quantas eu gostaria de ler, que nunca havera tempo suficiente para eu ler tudo o que eu quero, e mesmo que, hipoteticamente, eu parasse tudo o mais na minha vida e encontrasse tempo para ler todos os livros daquela loja que me interessam... a cada dia serao publicados mais e mais, novos volumes, de forma que a vida vai ser sempre uma compilacao de frustracoes. De repente a vida se tornou tao curta perto de tudo a se fazer, e tao longa perto de tanta complicacao. E o pior foi constatar que o mesmo vai acontecer sempre em outras esferas – bem mais subjetivas que livros – em minha vida.
Senti um panico tao grande dentro da livraria, e ao mesmo tempo uma vontade histerica quase irresistivel de comecar a cantar – como em um musical do Lars Von Trier – jogando todos os livros para o ar.
Eh claro que esse banquete de bobagens soh aconteceu em minha imaginacao, tendo em vista que aqui nao relato nenhuma prisao ou multa por estupidez em plena luz do dia!
E esses momentos, esses pequenos momentos que enquanto acontecem parecem tao grandes que nem conseguimos dimensionar direito, eh q trazem a beleza e a magia dos demais dias, onde percebemos que tudo o mais do que contemplar o infinito - a perfeicao da vida em seus desencontros e sustos - eh pequeno, e vai se desmanchar no ar, em um poetico dia de sol. Aguardo por mais um conjunto de dias (2009), onde farei planos, projetos, realizarei menos de metade deles, mas talvez eu consiga realizar – finalmente – aquele projeto de 2003... sei la!
Ainda nao modifiquei a lista de musicas que escutarei a noite, e nao sei se o farei ou se aguardarei novamente ser acordada pelo berro do roqueiro, na esperanca de no meio da noite ter uma dessas epifanias capazes de mudar as nossas vidas! – e soh em cogitar essa possibilidade, jah sinto o frio na barriga.
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